A expectativa da tramitação no Congresso Nacional da Proposta de Emenda à Constituição Federal (PEC) para redução da jornada de trabalho semanal de 44 para 36 horas ganhou destaque no debate público nos últimos dias. A proposta, que envolve a redução da jornada de trabalho sem diminuição proporcional da remuneração, tem o potencial de gerar consequências sociais e econômicas profundas, com impactos diretos na forma como as pessoas trabalham e como as empresas funcionam.
Quais são os limites da jornada de trabalho previstos na Constituição Federal (CF)? E sobre as escalas de trabalho?
Atualmente, o limite da jornada de trabalho é de 8 horas diárias e 44 horas semanais, fixados no artigo 7º, inciso XIII da CF. Não há previsão específica na CF sobre qualquer escala de trabalho.
O que a PEC pretende mudar?
A PEC pretende alterar o inciso XIII do artigo 7º da CF para reduzir a jornada semanal de trabalho de 44 para 36 horas, com a adoção da jornada 4X3 (quatro dias de trabalho e três de descanso). Apesar da mudança na semana de trabalho, o limite diário de 8 horas será mantido, não estando muito claro neste momento se haverá – e como se dará – a compensação das outras 4 horas semanais nos 4 dias de trabalho. A PEC entraria em vigor 360 dias após a publicação, o que daria um tempo de adaptação para empregados e empresas.
Como outros países têm lidado com a redução da jornada de trabalho?
Na Europa, alguns países têm testado a redução da jornada por meio de projetos piloto. Porém, até o momento, nenhum país proibiu oficialmente a jornada 6×1. Alguns exemplos dessas alterações:
- Islândia: entre 2015 e 2019 foi realizado o primeiro projeto piloto que reduziu a jornada semanal de 40 para 36 horas para funcionários do setor público, sem a redução proporcional de salários. Resultados preliminares não encontraram qualquer perda de produtividade e a redução passou a ser negociada entre sindicato e empresas;
- Bélgica: desde 2022 os empregados podem optar por trabalhar 4 dias ao invés de 5, mas sem reduzir as horas trabalhadas. As horas não trabalhadas na sexta, por exemplo, devem ser compensadas nos outros dias da semana. O principal objetivo dessa medida foi oferecer maior flexibilidade na organização do tempo de trabalho;
- Espanha: o governo implementou um projeto-piloto para pequenas e médias empresas, permitindo a redução da semana de trabalho em meio dia, sem cortes salariais. Empresas que aderirem podem receber apoio financeiro governamental, desde que implementem melhorias de produtividade dentro de um ano;
- Grécia: seguindo na contramão, desde julho de 2024 a jornada semanal foi ampliada de 40 para 48 horas em empresas que prestam serviços 24 horas por dia, 7 dias da semana. Nessas condições, a hora trabalhada no sexto dia terá o acréscimo de 40%.
Embora a ideia da redução da jornada de trabalho/adoção do modelo 4X3 tenha sido bem recebida pela opinião pública, sua implementação no Brasil, com certeza, enfrentará desafios, como:
- aumentar a produtividade, para que a redução das horas trabalhadas não tenha como consequência a diminuição da eficiência e volume de produção ou não prestação de serviços que, muitas vezes, são considerados como essenciais;
- evitar que eventual aumento nos custos das empresas em razão da redução das horas trabalhadas reflita em aumento dos preços aos consumidores;
- evitar um aumento da informalidade nos setores mais atingidos pela alteração promovida pela PEC, de forma que os empregados não sejam incentivados a prestar serviços como terceirizados, autônomos ou por meio de pessoas jurídicas;
- evitar que os empregados beneficiados com maior tempo livre em razão da redução da jornada semanal acumulem dois ou mais empregos ou passem a realizar “bicos” nas folgas.
Diante do impacto da mudança que ocorreria com a aprovação da PEC e das incertezas que ela traz, é fundamental que haja um debate amplo na sociedade brasileira sobre o tema, inclusive com um estudo aprofundado das experiências internacionais, para se evitar perda de produtividade, aumento de custos para empresas e consumidores e aumento da informalidade para empregados.